E a morte perderá o seu domínio

Dylan Thomas


E a morte perderá o seu domínio.

Nús os homens mortos irão confundir-se

com o homem no vento e na lua do poente;

quando, descarnados e limpos, desaparecerem os ossos

hão-de nos seus braços e pés brilhar as estrelas.

Mesmo que se tornem loucos permanecerá o espírito lúcido;

mesmo que sejam submersos pelo mar, eles hão-de ressurgir;

mesmo que os amantes se percam, continuará o amor;

e a morte perderá o seu domínio.



E a morte perderá o seu domínio.

Aqueles que há muito repousam sobre as ondas do mar

não morrerão com a chegada do vento;

ainda que, na roda da tortura, comecem

os tendões a ceder, jamais se partirão;

entre as suas mãos será destruída a fé

e, como unicórnios, virá atravessá-los o sofrimento;

embora sejam divididos eles manterão a sua unidade;

e a morte perderá o seu domínio.



E a morte perderá o seu domínio.

Não hão-de gritar mais as gaivotas aos seus ouvidos

nem as vagas romper tumultuosamente nas praias;

onde se abriu uma flor não poderá nenhuma flor

erguer a sua corola em direcção à força das chuvas;

ainda que estejam mortas e loucas, hão-de descer

como pregos as suas cabeças pelas margaridas;

é no sol que irrompem até que o sol se extinga,

e a morte perderá o seu domínio.


(Tradução de Fernando Guimarães)

MINHA SOMBRA


Jorge de Lima
De manhã a minha sombra
Com meu papagaio e o meu macaco
Começam a me arremedar.
E quando saio
A minha sombra vai comigo
Fazendo o que eu faço
Seguindo os meus passos.

Depois é meio-dia.
E a minha sombra fica do tamaninho
De quando eu era menino.
Depois é tardinha.
E a minha sombra tão comprida
Brinca de pernas de pau.

Minha sombra , eu só queria
Ter o humor que você tem,
Ter a sua meninice,
Ser igualzinho a você.

E de noite quando escrevo,
Fazer como você faz,
Como eu fazia em criança:
Minha sombra
Você põe a sua mão
Por baixo da minha mão,
Vai cobrindo o rascunho dos meus poemas
Se saber ler e escrever.